Fast-fashion. Estamos a falar da segunda indústria mais poluente do mundo, que já em 2015 chegou a produzir 1.2 mil milhões de toneladas de gases de efeito estufa, num valor superior às emissões de todos os vôos internacionais e transportes marítimos juntos.
Um estudo publicado na revista Nature Reviews Earth & Environment em abril deste ano revelou que a fabricação em massa de moda barata, o consumo desenfreado e o uso de pouca duração utilizam anualmente 1.5 bilhão de litros de água, produzem 1.7 mil milhões de toneladas de CO2, geram 190 mil toneladas de microplásticos nos oceanos e 92 milhões de toneladas de resíduos em aterros ou queimados – todos os anos a indústria incinera bilhões de euros em roupas, calçados e acessórios não vendidos.
Mesmo assim, segundo o relatório, a demanda por roupas novas aumentou para cerca de 62 milhões de toneladas de produtos têxteis por ano, com projeção de atingir os 102 milhões até 2030. Um consumidor médio nos Estados Unidos compra uma peça de roupa nova a cada 5,5 dias. Na Europa, consumidores compram de 14,5 kg (Itália) a 26,7 kg (Reino Unido) de roupas por ano.
Esse consumo constante causa problemas ambientais em todas as fases da vida de uma roupa. A sua curta vida útil, seja em razão da baixa qualidade ou das políticas de marketing da indústria, e o aumento das compras transformaram os têxteis em 22% de todo o lixo produzido pelo mundo. Estima-se que 300 mil toneladas de resíduos de moda vão direto para os aterros sanitários a cada ano.
Se todos esses números parecem muito abstratos, podemos exemplificar com uma situação mais rotineira: uma típica consumidora de moda europeia adolescente, super impactada com as constantes mudanças das novas coleções e com um orçamento restrito. Digamos que ela esteja a vestir uma t-shirt de algodão básica com estampa de glitter, uns jeans skinny fit e umas sandálias, um look que não lhe custou mais do que 40€. Quer saber qual foi o seu custo para planeta?
Só a t-shirt de algodão consumiu 3 mil litros de água antes mesmo de ir à máquina de lavar. Estima-se que a indústria da moda consuma cerca de 79 mil milhões de metros cúbicos de água por ano na irrigação da safra de algodão e no seu processamento industrial. Isso é água potável suficiente para 110 milhões de pessoas durante um ano inteiro. Sem falar no seu rasto tóxico, uma vez que o algodão sozinho é responsável por 16% do uso global de inseticidas e 7% de todos os herbicidas. A produção orgânica, que consome muito menos água e é muito mais sustentável em geral, não representa nem 1% da safra anual global de algodão. E a estampa colorida e metálica sinaliza a presença de um coquetel de venenos entre metais pesados, como o arsénio e o chumbo, e químicos perigosos como etoxilatos de nonilfenol. A indústria têxtil está entro os maiores poluidores mundiais de águas limpas, sendo o tingimento e o tratamento de têxteis responsáveis por 20% de toda a água industrial.
Isso nos leva à etiqueta “made in Bangladesh” encontrada nos jeans. A maioria das grandes marcas terceiriza a sua produção para países em desenvolvimento, com fraquíssimas regulamentações ambientais. Produtos químicos perigosos são normalmente despejados sem nenhum tratamento em cursos d’água sensíveis, onde contaminam as águas subterrâneas com poluentes bioacumulativos, desreguladores de hormónios e até cancerígenos. Além disso, esses jeans são feitos de poliéster, derivado do petróleo, um recurso finito. Tecidos sintéticos requerem lavagens mais frequentes do que as fibras naturais, porque são mais atraentes às bactérias que causam odores. Além de aumentarem o consumo de água, causam um outro grave impacto: a poluição dos oceanos por microplásticos. Tecidos como poliéster, nylon e acrílico são todos formas de plástico, e cada vez que são lavados soltam centenas de milhares de fibras que contaminam o meio-ambiente. Essas fibras não são retidas pelas estações de tratamento de esgoto, passando direto para os cursos d’água e, eventualmente, para o oceano. Lá, além de causarem imensa mortalidade da fauna, são ingeridas pela vida marinha, sobem na cadeia alimentar e voltam à terra na forma de um apetitoso jantar, quando então passam a contaminar o nosso próprio corpo. E, não bastasse tudo isso, como as fábricas estão normalmente localizadas longe dos mercados de consumo, essas roupas viajam grandes distâncias em navios, aviões ou camiões, que consomem petróleo e emitem CO2. Como muitas vezes elas são desenhadas num país, fiadas em outro, costuradas e acabadas em outro… o impacto é brutal. Há peças que viajam meio mundo, literalmente, para ainda por cima nunca serem vendidas (como ocorre com 30% de toda a produção) e acabarem em aterros ou queimadas.
E ainda nem falamos das sandálias! Em média, a produção de um sapato gera 14 kg de CO2. Com 15 mil milhões de pares produzidos por ano, o setor contribui significativamente para o maior desafio da humanidade hoje, que são as alterações climáticas. E como os sapatos velhos são geralmente descartados em vez de reciclados, os químicos e pigmentos de alta periculosidade usados na produção acabam contaminando o solo e a água nos aterros sanitários. Onde, aliás, também irá parar a t-shirt branca baratinha, que depois de umas cinco lavagens já perdeu a forma e a cor. Afinal, com a qualidade de hoje, sai mais em conta comprar uma peça nova do que arranjar uma usada.
Para quem ainda aguenta, vai mais um dado avassalador: nas palavras de Kirsi Niiminaki, professora e líder de pesquisa de moda do grupo Textiles Futures na Universidade Aalto de Helsínquia, “na década de 1950, 30% da renda familiar era gasta em roupas. Hoje, esse números é inferior a 10%, mas temos 20 vezes mais roupas.”
Portanto, o que mais falta para incentivar os consumidores a comprar menos, repensar a vida útil das suas peças e refletir melhor sobre as formas de descarte quando for o caso? Com todos os dados e números disponíveis, com toda as imagens assustadoras a que já temos acesso e com as previsões alarmantes que ouvimos todos os dias, o que mais falta para que façam melhores escolhas na hora de comprar, escolhendo marcas éticas e responsáveis, que minimizam os seus impactos ambientais?
Isso é consumo consciente. Faça a sua parte.