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Ordenado mínimo ou ordenado digno?

A indústria global da moda é alimentada por uma força de trabalho estimada em 60 milhões de pessoas, concentradas maioritariamente em países asiáticos que, por um lado, têm leis laborais extremamente brandas (quando existem) e, por outro, são hoje completamente dependentes da produção de vestuário.

As privações que a grande maioria desses trabalhadores e suas famílias enfrentam diariamente contrasta fortemente com os enormes lucros relatados anualmente por marcas de moda globais. De facto, o que essas marcas fazem é tão simples quanto isto: tirar proveito da miséria para explorar pessoas que não têm opção senão trabalhar em condições desumanas em troca de ordenados miseráveis. As condições de trabalho associadas à indústria têxtil na Ásia já foram, inclusive, comparadas a escravatura pelo Parlamento Europeu.

É apenas natural que essas marcas tenham optado por reduzir os custos e aumentar a lucratividade das suas peças. Mas, quando fecham os olhos para as condições a que são submetidas as pessoas que trabalham para o seu lucro, tornam-se coniventes com uma série de ilegalidades e tragédias.

A Organização Internacional do Trabalho estabelece o que se considera “trabalho decente” – conceito que faz parte da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável: rendimento justo, segurança no trabalho, proteção social às famílias, perspectivas de desenvolvimento pessoal e integração social, igualdade de géneros, bem como liberdade de expressão, organização e de participação em decisões que afetem a vida do trabalhador. Ou seja, isso é o mínimo para que se considere decente um trabalho.

Mas a realidade nos países asiáticos está muito aquém de tudo isso. Aliás, inúmeros são os casos que se tornam públicos de abusos e maus tratos, trabalho infantil e escravo, violência e tragédias.

E mesmo no melhor dos casos, os ordenados pagos são irrisórios ainda que atinjam o mínimo legal: na maioria desses países, o ordenado mínimo legal corresponde a um valor que varia entre 1/5 e metade daquilo que é considerado um ordenado digno. Isto é, aquilo que os empregados auferem não chega nem mesmo para satisfazer as suas necessidades mais básicas como comida, moradia, higiene e saúde.

Em teoria, um ordenado digno não difere do ordenado mínimo. Ambos estabelecem um piso vinculativo sobre os ordenados, abaixo do qual nenhum empregado pode (legalmente) ser pago. Mas na prática existem várias diferenças entre os ordenados mínimo e digno, seja em seu valor e propósito. Essencialmente, enquanto o ordenado mínimo define um mínimo legal, o ordenado digno aspira a ser um mínimo socialmente aceitável, isto é, um valor que mantém os trabalhadores fora da pobreza. Idealmente, o ordenado mínimo deveria ser fixado igual ou acima do ordenado digno.

O direito a uma remuneração justa, que garanta a existência digna da pessoa humana, é considerado pela ONU como direito fundamental. A própria OIT identifica a provisão de um ordenado mínimo digno como uma das condições para a paz universal e duradoura, baseada na justiça social.

E os Princípios Orientadores da ONU sobre Negócios e Direitos Humanos estabelecem claramente que as “empresas devem evitar infringir os direitos humanos de outras pessoas e devem abordar os impactos adversos aos direitos humanos com os quais estão envolvidos”. E não param por aí, acrescentando ainda que tal responsabilidade existe “independentemente da capacidade e disposição dos Estados de cumprir as suas próprias obrigações”, e “para além do cumprimento das leis e regulamentos nacionais que protegem os direitos humanos”.

Em outras palavras, considerando os direitos humanos fundamentais, os Princípios sobre Negócios e as regras laborais internacionais, é fácil concluir que, nos casos em que o ordenado mínimo legal nos países de produção não atinja o nível mínimo de subsistência para os trabalhadores (ordenado digno), as empresas têm a obrigação de remediar as falhas do Estado.

Mas o que se vê, na realidade, é que essa lógica tem sido solenemente ignorada, senão pervertida pela indústria fashion global.

Incontáveis pesquisas, estudos e relatórios demonstram que nenhuma das marcas convencionais high street, fast fashion ou mesmo do segmento de luxo consegue garantir que os trabalhadores na sua cadeia de produção recebem um ordenado digno.

E pior: sob o imoral argumento de que “pelo menos têm trabalho” ou “pelo menos recebem o ordenado mínimo”, essas marcas nem sequer reconhecem que as suas lucrativas práticas de negócio têm um efeito direto sobre a vida de milhões trabalhadores, privando-os não apenas de um ordenado justo, mas também de segurança laboral, acesso a cuidados de saúde, alimentação adequada, educação, transporte, horas de sono e convívio social e familiar. Nem mesmo quando as inevitáveis horas extras são devidamente remuneradas pode-se garantir alguma qualidade de vida a essas pessoas. Poupança para colmatar eventuais adversidades ou a realização de um sonho em especial provavelmente nem estão no seu horizonte.

Uma simples conta de padaria mostra que o ordenado de um trabalhador da indústria da moda, nessa dinâmica de poder, representa uma ínfima fração do que nós consumidores pagamos pelas roupas que compramos. Um exemplo que ficou bem conhecido foi o equipamento da seleção inglesa de futebol no Mundial de 2018 (e o seu indefetível emblema da Nike): foram vendidos a 180€, enquanto os trabalhadores em Bangladesh que o fizeram ganhavam menos de 2€ por dia de ordenado.

Não podemos esperar que a solução para este problema venha apenas das políticas governamentais dos países de produção têxtil (não importa se asiáticos, africanos ou europeus). Afinal, sempre que um deles aprimorar as suas leis e acabar por onerar a indústria, a indústria só tem de fazer as malas e mudar-se para outro país mais leniente ou dependente. A solução está na outra ponta: quando as marcas se comprometerem a pagar mais pelas suas encomendas de produção, então as fábricas serão capazes de cobrir todos os seus custos de produção, incluindo a mão de obra.

Com um salário digno calculado regionalmente, o custo real e justo da mão de obra poderá ser incorporado pelas marcas no seu custo total, garantindo-se que os seus fornecedores estarão a receber pelas encomendas o suficiente para pagar salário dignos. Além de assegurar remuneração justa aos trabalhadores, essa medida sinaliza aos próprios governos que o aumento do ordenado mínimo local não acarretará o risco de perda de negócios e prejuízos à Economia. E esse compromisso também abrirá espaço nas negociações salariais entre os trabalhadores e os proprietários das fábricas, pois as próprias marcas é que vão arcar com a remuneração da mão de obra.

Ninguém está a dizer que as grandes marcas de moda não devam lucrar o mais possível. Mas elas certamente não o podem fazer ao sacrifício da subsistência e dos mais básicos direitos de milhões de pessoas. Portanto, é delas a obrigação de comprometerem-se com práticas de compra mais justas.

A nossa parte, enquanto consumidores, é estar sempre a questionar as nossas marcas favoritas quanto às suas políticas, buscar informação fidedigna e fazer sempre as melhores escolhas. Um consumidor consciente e responsável é meio caminho andado para a mudança social e ambiental que a indústria fashion sempre anuncia, mas nunca faz.

Então vamos juntos plantar essa semente! 🌱

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